IRS – Transmissão de herança ou quinhão hereditário – Não incidência de IRS
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2025-04-29 (Processo n.º 33/24BALSB)
(Ofício Circulado n.º 20281/2025, de 25 de julho, da DSIRS/AT)
«O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STA), n.º 7/2025, de 2025-04-29, processo nº 33/24.BALSB, publicado no DR, 1.ª Série, n.º 107, de 2025-06-04, na sequência de recurso de uniformização de jurisprudência considerando a oposição de julgados de duas decisões proferidas em autos de processo arbitral, veio uniformizar a jurisprudência no sentido de que “A alienação de quinhão hereditário não configura “alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis”, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, pelo que não estão sujeitos a este imposto os eventuais ganhos resultantes dessa alienação”.
Em cumprimento do disposto no n.º 4 do artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária, a AT procedeu à revisão do seu entendimento nesta matéria, passando a considerar que os ganhos decorrentes da alienação do direito à herança ou da alienação do direito ao quinhão hereditário, ainda que a herança indivisa seja constituída apenas por um ou vários bens imóveis, não estão sujeitos a tributação em sede de IRS, pois não configura “uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis” nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS.
Em conformidade, foram divulgadas instruções aos Serviços da AT, através da Instrução de Serviço n.º 20029, Série I, de 2025-06-18, considerando a aplicação imediata deste entendimento, designadamente, aos procedimentos administrativos e processos judiciais pendentes.
Não obstante, têm ainda sido suscitadas algumas dúvidas, quer pelos contribuintes quer pelos Serviços, pelo que se prestam os seguintes esclarecimentos:
- Extrai-se, inequivocamente, do supracitado acórdão do STA que uniformiza a jurisprudência, que a alienação onerosa da herança (no caso de haver um único herdeiro ou acordo de todos os herdeiros na alienação da herança) ou a alienação onerosa do quinhão hereditário (alienação de parte da herança), nos termos do artigo 2124.º do Código Civil, que integre bens imóveis, não se enquadra na norma de incidência da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Código do IRS, na sua redação atual, porquanto a mesma reporta-se à transmissão onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e não à transmissão da herança ou do quinhão hereditário enquanto transmissão de um direito abstratamente considerado e idealmente definido.
- Considerando este enquadramento jurídico, na Instrução de Serviços suprarreferida ressalvou-se que “este entendimento se aplica apenas quando decorrer inequivocamente da escritura pública ou documento similar que se transmite o direito de um ou vários herdeiros à herança ou ao quinhão hereditário, como um todo.”
- Com efeito, tendo presente o artigo 2124.º do Código Civil, o que o herdeiro transmite é o direito à herança ou o direito de quinhão hereditário, que consiste na quota-parte ideal que um sucessível detém numa herança indivisa (herança aceite, mas ainda não partilhada).
- Assim, a alienação da herança ou a alienação do quinhão hereditário tem por objeto a universalidade de bens e direitos (um todo) que compõem a herança indivisa ou o quinhão hereditário e não qualquer direito individual sobre os bens ou direitos que integram a herança, passando o adquirente a ocupar a posição que cabia ao herdeiro na herança, sendo-lhe transmitidos os direitos inerentes, nomeadamente de exercer os direitos relativos à gestão da herança ou exigir a sua partilha.
- Não obstante, podem ocorrer outras situações, que com esta não se confundem, em que são alienados bens específicos e determinados que compõem a herança indivisa, conjuntamente por todos os herdeiros, enquanto ato de disposição nos termos do artigo 2091.º, n.º 1 do Código Civil.
- Ora, nestes casos, em que os herdeiros alienam um bem imóvel específico e determinado da herança indivisa, não estamos já perante a alienação do direito à herança ou do direito ao quinhão hereditário, mas antes perante uma transmissão de um bem em concreto cujos ganhos decorrentes da venda constituem mais-valias tributáveis em sede da categoria G de IRS, nos termos gerais.
- Assim, o presente entendimento aplica-se apenas quando, inequivocamente, a situação de facto corresponda à alienação onerosa do direito à herança ou do quinhão hereditário que integre bem imóvel.
- Considerando que o presente entendimento da AT tem efeitos imediatos no contencioso administrativo ou judicial pendente ou que venha a ser instaurado nos termos e prazos legalmente previstos, importa salientar que a retroação de efeitos deste entendimento se limita aos termos gerais de revisão dos atos tributários, estando impedida a revisão de atos tributários cujos prazos legais de reação administrativos (reclamação graciosa, recurso hierárquico ou revisão oficiosa), impugnação judicial ou pedido arbitral, já tenham decorrido e/ou tenham sido objeto de procedimento de contencioso administrativo ou judicial, cuja decisão tenha transitado em julgado.
Com os melhores cumprimentos,
Helena Pegado Martins
Subdiretora-Geral»