Resíduos de embalagens e outros fluxos – «Ecovalor» discriminado na fatura

O Decreto-Lei 152-D/2017, de 11 de dezembro, aprovou e codificou o regime jurídico a que fica sujeita a gestão de vários fluxos específicos de resíduos (embalagens e resíduos de embalagens, óleos, pneus, equipamentos elétricos e eletrónicos, pilhas e acumuladores e veículos em fim de vida), transpondo para o Direito nacional várias Diretivas.

Entre outras alterações aos regimes vigentes, estabeleceu, com entrada em vigor marcada para o próximo dia 1 de janeiro de 2020, veio obrigar os produtores e distribuidores a discriminar ao longo da cadeia, nas transações entre operadores económicos, num item específico a consagrar na respetiva fatura, o valor correspondente à prestação financeiravisible fee», «ecotaxa», «ecovalor»…) fixada a favor da entidade gestora [Sociedade Ponto Verde, Novo Verde, AMB3E (Electrão), ERP Portugal, Valormed, SIGERU, Sogilub, Valorpneu, Ecopilhas, Valorcar, GVB, consoante o fluxo específico], obrigação que não se aplica às pilhas portáteis mas que se estende às transações com o consumidor final no caso específico do fluxo de pneus e pneus usados,

Uma obrigação nova para a generalidade dos agentes económicos por incidir sobre a generalidade dos resíduos, que coloca problemas novos e complexos àqueles face à natureza e diversidade destes, que levou a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), cuja Direção a APCMC integra, corporizando as preocupações do setor, a pedir por carta ao Ministro do Ambiente e da Transição Energética a revisão do diploma.

 

«ASSUNTO: Decreto-Lei nº 152-D/2017 – Visibilidade de prestação financeira (Ecovalor)  fixada a favor da entidade gestora

Exmo. Senhor,

O Decreto-Lei n.º 152-D/2017 de 11 de Dezembro estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a gestão de vários fluxos de resíduos. Este diploma estabelece ainda medidas de protecção  do ambiente  e de saúde humana.

Sendo a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, CCP, a estrutura que agrega mais de uma centena de Associações do Comércio e Serviços, este regime aplica-se a inúmeras actividades representadas por esta Confederação. Neste contexto, muitos dos nossos associados estão directamente envolvidos em vários sistemas de gestão de fluxos de resíduos.

Sem prejuízo das iniciativas que foram sendo desenvolvidas quer pela CCP, quer pelos associados, a propósito deste regime, há um aspecto que neste momento nos preocupa em especial.

Referimo-nos, em concreto, à obrigatoriedade, prevista no nº 6 do artigo 14 do Decreto-Lei  supra citado nos termos do qual "os produtores e os distribuidores discriminam ao longo da cadeia económica, num item específico a consagrar na respetiva fatura, o valor correspondente à prestação financeira fixada a favor da entidade gestora".

Esta disposição (que entra em vigor a 01.01.2020) levanta aos sectores por nós representados, inúmeros problemas.

Indicam-se, a título exemplificativo, algumas das dificuldades que se antecipam:

  1. Desde logo, novos custos financeiros decorrentes da necessidade de alteração de sistemas informáticos e da facturação, e, como sempre acontece quando há alteração destes sistemas, também novos custos de formação de recursos humanos e custos administrativos;
  2. Não é também para nós claro que todas as empresas consigam individualizar, para todos os produtos, o Ecovalor;
  3. Mas esta alteração significa também uma ingerência na política comercial de cada empresa, já que deveria ser dado ao operador económico a liberdade de escolha entre tornar ou não visível o Ecovalor;
  4. Finalmente, mas não menos importante, o problema dos retalhistas quando vendem a consumidor final, o qual não obstante esse facto, indica no momento do pagamento um NIF de pessoa colectiva. Ninguém ignora que se trata de uma situação frequente. No entanto, o diploma não clarifica que nestas situações a obrigação prevista no nº 6 do artigo 14º não se aplica. Se por mera hipótese se confirmar que estamos perante uma nova obrigação para o retalhista, então a complexidade inerente a este regime será claramente exponenciada quer ao nível dos sistemas de informação e facturação, (resta ainda perceber se a dualidade na facturação é exequível, pelo menos a custos razoáveis), quer quanto ao número de operadores económicos abrangidos. Neste cenário é possível afirmar, desde já, que não haverá condições e tempo útil para rever todos os sistemas, desde logo por falta de capacidade das empresas prestadoras de serviços informáticos e de facturação.

Face ao exposto, vimos solicitar a revisão deste normativo, sugerindo-se a adopção da redacção anterior à entrada em vigor deste diploma, a qual, sem impor, concedia aos operadores económicos a faculdade de, no relacionamento entre profissionais, explicitarem os ecovalores  nas tabelas e facturas e, em simultâneo, clarificar que o sector retalhista não está abrangido por esta disposição.

Na expectativa da melhor atenção para este assunto, apresento os meus melhores cumprimentos.

O Presidente da Direcção

João Vieira Lopes»

 

A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e a Direção-Geral das Atividades Económicas (DGAE) emitiram entretanto uma Circular sobre o assunto, que passamos a reproduzir na íntegra, em resposta a várias questões que lhes têm sido colocadas, designadamente sobre o nível de discriminação necessário a constar nas faturas e a forma como a informação deve estar visível tendo em conta os diferentes fluxos abrangidos.

Circular, porém, que evidencia à saciedade a «enormidade» daquilo que o Estado pretende impor às empresas, afogando-as em mais encargos e burocracias e não se dignando sequer partilhar com elas a que superior interesse lhes exige tanto…, verdadeiro reflexo do desconhecimento que tem do país e da realidade da sua economia e empresas (como as do nosso setor específico, em que numa fatura incluímos em regra diversos produtos e tipos de embalagens e respetivos resíduos, dos mais diversos formatos, como papel, cartão, plástico, metal, vidro e madeira…    

 

«CIRCULAR

N.º: 02/2019/DRES-DFEMR

Data: fevereiro 2019

Destinatário: Produtores e Distribuidores

Assunto: Visible Fee (Discriminação nas faturas da prestação financeira paga a favor das entidades gestoras de sistemas integrados de gestão de fluxos específicos de resíduos)

Enquadramento Legal: Artigo 14.º (6) do Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de setembro

A publicação do Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro, que unifica o regime da gestão de fluxos específicos de resíduos sujeitos ao princípio da responsabilidade alargada do produtor, doravante designado Unilex, no n.º 6 do artigo 14.º, veio estabelecer como obrigação aplicável a todos os operadores económicos que nela se enquadrem, a discriminação, num item específico a consagrar na respetiva fatura, do valor correspondente à prestação financeira paga a favor de uma entidade gestora de fluxos específicos de resíduos. Os operadores económicos deverão dar cumprimento a esta obrigação a partir de 01 de janeiro de 2020.

Face às questões que têm sido dirigidas à Agência Portuguesa do Ambiente e à Direção-Geral das Atividades Económicas, sobre a forma como deverá esta obrigação ser implementada, nomeadamente qual o nível de discriminação necessário a constar nas faturas e qual a forma como a informação deverá estar visível tendo em conta os diferentes fluxos abrangidos, pretende esta circular prestar alguns esclarecimentos aos operadores económicos abrangidos pelo Decreto-Lei em causa.

Importa, antes de mais, referir que o facto de se encontrar redigido nos termos do artigo supra mencionado que a informação deverá estar “num item específico” é considerado um claro indicador que este dado deve ser visível (i.e., separado dos restantes valores da fatura), indicando de forma clara que o valor em causa corresponde à prestação financeira que foi paga a favor de uma entidade gestora de fluxos específicos de resíduos, sendo que o valor deverá ser repercutido ao longo da cadeia de valor.

Esta obrigação inicia-se com o primeiro operador económico que coloca os seus produtos ou os seus produtos embalados no mercado, de acordo com a definição constante no Unilex, ou com o fabricante de embalagens de serviço, cujos produtos e/ou embalagens se encontram contratualizados com uma (ou mais) entidades gestoras licenciadas para gestão de fluxos específicos de resíduos.

A discriminação na fatura deverá acontecer ao longo da cadeia, entre operadores económicos, mantendo-se em todas as transações que ocorram previamente à venda do produto, produto embalado ou embalagem de serviço ao consumidor final.

O detalhe de informação deverá ser apresentado por fluxo, pelo tipo (tipologia, subcategoria, ou material, de acordo com a tabela de prestações financeiras aprovada) e quantidade de produto associado a cada fluxo, embalagem de produto e/ou embalagem de serviço que está a ser transacionada e que constará em cada fatura emitida entre operadores económicos.

O produtor, embalador e/ou fabricante de embalagens de serviço não necessita de apresentar uma linha por cada produto faturado, mas deverá discriminar na fatura, dentro de cada fluxo, as diferentes prestações financeiras pagas pelos diferentes materiais e/ou diferentes tipologias e/ou subcategorias de produtos.

No caso do fluxo dos pneus usados, a obrigação prevista no Unilex aplica-se também nas transações com o consumidor final. No caso das pilhas portáteis não é aplicável a discriminação do valor na fatura entre operadores económicos nem na fatura para o consumidor final.

A título de exemplo, apresenta-se uma situação hipotética de faturação de uma série de produtos.

Produto        N.º unidades Valor (€)

Telemóveis
Valor unitário por equipamento
Auriculares
Valor unitário por equipamento
Impressoras 
Valor unitário por equipamento       
Telefone fixo   
Valor unitário por equipamento       

300

500

150

400
 

45.000
(150)
5.000
(10)
112.500
(750)
26.000
(65)
Total a Cobrar      188.500

 

Prestação financeira (ecovalor) a favor das entidades gestoras de Sistemas Integrados de Gestão de Resíduos de Equipamentos Elétricos e Eletrónicos (EEE)

 

Peso unidade (t.)

N.º unidades

Ecovalor (€/t)

Valor (€)

Telemóveis

0,0007

300

40

8,4

Auriculares

0,0002

500

35

3,5

Impressoras

0,002

150

65

19,5

Telefones fixos

0,0008

400

40

12,8

Total pago a favor das entidades gestoras de REEE

44,2

 

 

Prestação financeira (ecovalor) a favor das entidades gestoras de Sistemas Integrados

de Gestão de Resíduos de Embalagens

Material de embalagem

Peso material (t.)

Ecovalor (€/t)

Valor (€)

Papel e Cartão

1,2

80

96

Plástico

0,27

200

54

Total pago a favor das entidades gestoras de embalagens e resíduos de embalagens

150

 

Prestação financeira total a favor das entidades gestoras de fluxos específicos de resíduos

194,2

 

Total a cobrar ao cliente

188.694,2 €

A discriminação na fatura pode ser feita da seguinte forma:

Prestação financeira a favor das entidades gestoras de REEE

Telemóveis

8,4 €

Auriculares

3,5 €

Impressoras

19,5 €

Telefones

12,8 €

 

 

Prestação financeira a favor das entidades gestoras de Embalagens e Resíduos de Embalagens

Papel/cartão

96 €

Plástico

54 €

 

Nota: A tabela foi construída a título de exemplo sem seguir nenhuma metodologia nem com base em eventuais regras de faturação. O objetivo consiste em exemplificar qual o detalhe de informação que é pretendido em cada transação. A forma como a informação deverá ser disposta fica à consideração de cada produtor na aceção prevista no Unilex, desde que o detalhe corresponda ao que se encontra ilustrado.

Relembra-se que no caso das pilhas portáteis, a obrigação não é aplicável, e, como tal, não se deve apresentar discriminada a prestação financeira paga a favor das entidades gestoras de resíduos de pilhas e acumuladores, por exemplo pelas baterias dos telemóveis.

Considera-se que os valores aqui apresentados já incluem IVA.

 

Agência Portuguesa do Ambiente

Direção-geral das Atividades Económicas

15 de fevereiro de 2019»

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