Alterações ao arrendamento urbano

Publicadas no mesmo dia, 14 de junho, e já em vigor desde 24 e 15 de junho p.p., respetivamente, as Leis 42/2017 e 43/2017 alteraram o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, incluindo algumas normas do Código Civil relativas ao tema, e o Decreto-Lei 157/2006, de 8 de agosto, que aprovou o regime jurídico das obras em prédios arrendados.

 

Estabelecimentos/entidades de interesse histórico e cultural ou social local

As alterações operadas pela Lei 42/2017 decorrem da aprovação que faz do regime de reconhecimento e proteção de estabelecimentos e entidades de interesse histórico e cultural ou social local, ato da competência das câmaras municipais, oficiosamente ou a requerimento do interessado, da Junta de Freguesia ou de associação de defesa do património cultural, cumpridos que sejam alguns critérios (atividade, exercida há pelo menos 25 anos, património material e património imaterial, como arquitetura, elementos decorativos e artísticos, acervo, mobiliário, contributo para a identidade urbana…), que assegura a tais estabelecimentos ou entidades proteção no âmbito do arrendamento, do regime de obras em prédios arrendados e do acesso a programas específicos de apoio, municipais ou nacionais.

São estabelecimentos de interesse histórico e cultural ou social local as «lojas com história» (estabelecimentos comerciais com especial valor histórico cuja preservação deva ser acautelada) e os pequenos estabelecimentos de «comércio tradicional» (onde a atividade de comércio local, restauração ou bebidas é realizada, situados fora de grandes superfícies comerciais, especializados na venda de um produto ou na prestação de um serviço, com exceção das atividades não sedentárias, designadamente em bancas ou feiras), abertos ao público e que pela sua atividade e património material ou imaterial, constituam uma referência viva na atividade económica, cultural ou social local.

O reconhecimento é precedido de consulta pública pelo período de 20 dias e é válido por 4 anos, automaticamente renovável, podendo ser revogado pela câmara municipal caso se deixem de verificar os respetivos pressupostos.

Nos termos da nova alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º do NRAU, o inquilino de arrendamento não habitacional (celebrado antes da entrada em vigor da Lei 6/2006, que aprovou o NRAU…) que, em resposta à comunicação do senhorio para atualização da renda e transição do contrato para o NRAU, invoque e comprove que no locado existe um estabelecimento ou entidade de interesse histórico e cultural ou social local reconhecidos pelo município, o contrato só fica submetido ao NRAU, na falta de acordo, no prazo de 10 anos a contar da receção, pelo senhorio, da resposta do inquilino.

Face, porém, à disposição transitória do nº 2 do artigo 13º, o contrato, salvo acordo das partes, não pode ser submetido ao NRAU pelo prazo de 5 anos a contar da entrada em vigor da Lei 42/2017, ou seja, até 24 de junho de 2022.

E se o contrato já havia transitado para o NRAU, o senhorio não poderá opor-se à sua renovação  por um período adicional de 5 anos.

E nesse período, de 10 ou 5 anos, o valor atualizado da renda será determinado, na falta de acordo, conforme os critérios referidos nas alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 35º do NRAU, ou seja, tendo como limite máximo o valor anual correspondente a 1/15 do valor patrimonial tributário do locado, determinado nos termos do Código do IMI.

Outra proteção de que beneficia respeita ao regime de denúncia do contrato pelo senhorio para realização de obra de remodelação ou restauro profundos, previsto no artigo 6º do Decreto-Lei 157/2006, de 8/8, que não lhe será aplicável, mantendo-se o inquilino no locado e competindo à câmara municipal salvaguardar a manutenção da atividade e património material existentes no locado, impondo para o efeito as condicionantes necessárias.

Em caso de necessidade de demolição do locado, esta só é permitida pelo município em caso de situação de ruína ou de verificação em concreto da primazia de um bem jurídico superior ao que está presente na tutela dos bens em causa, desde que, em qualquer dos casos, se não mostre viável nem razoável, por qualquer outra forma, a salvaguarda ou o deslocamento do estabelecimento, bem como quando a situação de ruína não seja causada pelo incumprimento do dever de conservação exigível ao proprietário, podendo o município decretar sempre medidas adequadas à manutenção de todos os elementos que se possam salvaguardar, autorizando apenas as demolições estritamente necessárias.

Autorizada a demolição, o inquilino terá direito a uma indemnização igual a 2 anos de renda, de valor não inferior a duas vezes o montante de 1/15 do valor patrimonial tributário do locado.

Indemnização que será igual a 4 anos de renda se a situação de ruína for causada pelo incumprimento do dever de conservação (artº 89º do regime jurídico da urbanização e edificação – DL 555/99, de 16/12) ou do dever de reabilitação (artº 6º do DL 307/2009, de 23/10), ou a 10 anos de renda, aqui determinada nos termos das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 35º do NRAU (i. é, tendo como limite máximo o valor anual correspondente a 1/15 do valor tributário do locado), se a situação de ruína resultar de ação ou omissão culposa por parte do proprietário…

 

Alterações operadas pela Lei 43/201

Comunicações

* A comunicação do senhorio ao inquilino com vista à resolução do arrendamento efetuada por contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução passa a incluir prova de mandato para o efeito.

* A comunicação para resolução do contrato deixa de se considerar recebida pelo inquilino quando este não proceda ao levantamento da carta, após aviso postal. Sendo devolvida ao senhorio, este deverá remeter nova carta para o efeito (entre 30 a 60 dias depois, considerando-se então o inquilino notificado mesmo que não proceda de novo ao seu levantamento, no 10º dia posterior ao envio).

* As comunicações do senhorio consideram-se ineficazes quando, sendo o locado casa de morada de família, não for dirigida a ambos os cônjuge (comunicações para efeitos de transição para o NRAU e atualização de renda, ou que integrem título para pagamento de rendas, encargos ou despesas ou que possam servir de base a processo de despejo).

 

Transição para o NRAU

* Salvo acordo das partes, o contrato habitacional só transita para o NRAU no prazo de 8 anos (antes 5) quando o inquilino habitacional invoca e comprova rendimento anual bruto corrigido (RABC) inferior a 5 salários mínimos anuais.

* Nesse prazo de 8 anos a renda pode ser atualizada, na falta de acordo, até ao valor de 1/15 do valor tributário do locado, correspondendo a um máximo de:

– 25% do RABC; ou

– 17% do RABC, se o rendimento mensal do agregado familiar do inquilino for inferior a € 1500; ou

– 15% do RABC, se o rendimento mensal for inferior a € 1000 (NOVO); ou

– 13% do RABC, se o rendimento mensal for inferior a € 750 (NOVO); ou

– 10% do RABC, se o rendimento mensal for inferior a € 500.

O prazo é de 10 anos (antes 5 anos) se a invocação do RABC for efetuada por inquilino com idade não inferior a 65 anos ou deficiência com grau de incapacidade não inferior a 60%,

* Findo o período de 8 anos, o senhorio pode promover a transição do contrato para o NRAU, não podendo então o inquilino voltar a invocar o RABC, considerando-se o contrato celebrado com prazo certo, de 5 anos (antes 2), no silêncio ou falta de acordo do inquilino. No caso de inquilino com idade não inferior a 65 anos ou deficiência com grau de incapacidade não inferior a 60%, a transição para o NRAU no final do período de 10 anos depende sempre do seu acordo.

 

Arrendamentos não habitacionais

* O contrato só transita para o NRAU, na falta de acordo, no prazo de 10 anos (antes 5) quando o inquilino invoca e comprova que no locado:

 – existe um estabelecimento comercial aberto ao público e que é uma microempresa

– funciona uma pessoa coletiva de direito privado sem fins lucrativos (…) ou que prossegue uma atividade declarada de interesse nacional

– funciona casa fruída por república de estudantes

– existe um estabelecimento ou uma entidade de interesse histórico e cultural ou social local reconhecidos pelo município, nos termos do respetivo regime jurídico.

* Nesse período de 10 anos a renda atualizada tem como limite máximo anual o valor de 1/15 do valor tributário do locado, na falta de acordo.

* Findo o período de 10 anos o senhorio pode de novo promover a transição do contrato para o NRAU, não podendo o inquilino invocar de novo qualquer das circunstâncias supra referidas e considerando-se o contrato celebrado com prazo certo de 5 anos (antes 3 anos) no silêncio ou falta de acordo do inquilino. Neste prazo de 5 anos o senhorio pode atualizar a renda, que na falta de acordo terá como limite máximo o valor correspondente a 1/15 do valor tributário do locado, podendo ainda aplicar os coeficientes de atualização anual de renda.

* Novidade constitui também o novo art.º 57.º-A do NRAU, que dispõe que o arrendamento de duração indeterminada para habitação não caduca no caso de morte de inquilino realojado por iniciativa do senhorio por efeito de demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos que obrigue à desocupação do locado, caso se trate do primitivo arrendatário, transmitindo-se o arrendamento nos termos do art.º 57.º do NRAU.

 

Obras em prédios arrendados

As alterações aos artºs 4º, 6º, 8º e 25º e o aditamento do artº 9º-A ao DL 157/2006, que consagra o regime jurídico das obras em prédios arrendados, traduzem-se no seguinte:

* Redefinição do conceito de obras de remodelação ou restauro profundos

* Aumento significativo do valor da indemnização a pagar ao inquilino em caso de denúncia do arrendamento de duração indeterminada justificada pela realização de obra de remodelação ou restauro profundos, que passa de 1 ano para 2 anos de renda e a ter como limite mínimo um valor igual a 2 vezes o montante de 1/15 do valor tributário do locado. O pagamento, por outro lado, passa a ser feito após a confirmação da denúncia (50%) e no ato da entrega do locado (50%), sob pena de ineficácia, quando antes era efetuado apenas nesta última fase

O período de realojamento garantido ao inquilino, em alternativa, passa de 2 para 3 anos

* Direito de preferência do inquilino objeto de denúncia em caso de novo arrendamento promovido pelo senhorio, pelo período de 2 anos

 

Alterações ao Código Civil

Na consequência das alterações operadas nos artigos 1083º, 1084º, 1094º e 1103º do Código Civil:

  • O atraso mínimo no pagamento das rendas pelo inquilino justificativo da resolução do contrato passa de 2 para 3 meses
  • Fica sem efeito a resolução fundada na oposição pelo inquilino à realização de obra ordenada por autoridade pública quando esta cessa no prazo de 60 dias (antes, 30 dias)
  • O arrendamento para habitação passa a considerar-se celebrado pelo prazo certo mínimo de 5 anos (antes, 2 anos) no silêncio das partes
  • A desocupação do locado pelo inquilino por motivo de obras ou demolição deve efetuar-se em 60 dias (antes em 15 dias).

 

Partilhar:

Outros Destaques